Mariana Costa
A assinatura da Lei Áurea completou 134 anos em 13 de maio. O documento, assinado pela princesa Isabel em 1888, "libertou" os negros da escravidão após séculos de exploração. A data histórica foi usada pela Fundação Educafro para pedir à Justiça brasileira uma reparação histórica à comunidade negra.
Segundo o coordenador da Educafro, Frei David, o dia foi escolhido pela entidade "com o objetivo de refundar o 13 de maio, numa perspectiva de lutas por reparação". "Basta desta visão superficial de que a princesa foi a redentora do povo afro", disse.
Para a organização, a desigualdade racial presente no país "viola frontalmente" o que a Constituição Federal assegura. A entidade também avalia que o Estatuto da Igualdade Racial é ignorado pelos governos de todas as esferas, do municipal ao federal.
"Tanto por ação, quanto por omissão, o estado brasileiro, representado pela União Federal, incide na prática de ato ilícito ao promover a marginalização da população negra. Dessa forma, tem-se que tanto por ação, quanto por omissão, o Estado, representado pela União federal, incide na prática de ato ilícito ao promover a marginalização da população negra", explica a Educafro em um trecho do documento.
A ação civil pública foi ajuizada na 5ª Vara Cível Federal de São Paulo. Após recursos, o processo deve ir a julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). O Ministério Público Federal (MPF) e a Advocacia-Geral da União (AGU) devem dar seus pareceres sobre o tema.
A organização diz ter tomado a decisão de ir à Justiça contra a União após um caso ocorrido na cidade de Evanston, no estado de Illinois (EUA). Em março do ano passado, a Câmara Municipal da cidade determinou o pagamento de restituições em dinheiro a pessoas negras, como forma de reparação histórica pela escravidão, políticas de segregação e consequências do racismo ao longo dos anos.
Em Evanston, o programa de reparação vai funcionar com a distribuição de até US$ 5 mil (R$ 138 mil) para as famílias negras. Para financiá-lo, a cidade usará doações comunitárias e a receita do imposto sob a maconha recreativa, que foi legalizada em 2020. A ideia é distribuir cerca de US$ 10 milhões por 10 anos.
O brutal assassinato de George Floyd, que gerou manifestações no mundo inteiro, fez outros países tomarem medidas semelhantes. Suíça e Canadá, por exemplo, também já discutem a possibilidade de reparações aos negros.
Em 2019, os suíços criaram o Comitê de Reparação da Escravatura (SCORES). O grupo avaliou que o país lucrou com o processo escravocrata ocorrido entre as Américas e a África e, por isso, exigiu "reconhecimento e reparação imaterial e material".
Neste ano, o diretor de uma das faculdades mais prestigiadas do mundo, a Universidade Harvard, em Cambridge, também informou que o centro de ensino criaria um fundo para financiar projetos de pesquisa sobre a escravidão.
Em relatórios recentes, Harvard foi acusada de corroborar com pesquisas de teses racistas. "A escravidão e sua herança fazem parte da história americana há mais de 400 anos. O trabalho de reparação de seus efeitos persistentes necessitará de esforços ambiciosos nos próximos anos", declarou o presidente da universidade norte-americana, Larry Bacow.
O início da onda de protestos foi em Minnesota, mas as manifestações se estenderam a diferentes cidades dos Estados Unidos e do mundoRobert Nickelsberg/Getty Images
No documento, "além de uma postura abusiva no passado", a Educafro alega que o governo atual vulnerabiliza os cidadãos negros de modo sistemático, além de não elaborar políticas que efetivamente atuem contra os prejuízos da escravidão e, consequentemente, do racismo estrutural.
"Observando-se os dados sociais do país, verifica-se que o estado não somente segue inerte para cumprir um dos objetivos da República, como também atua de maneira a se manter o panorama inalterado", afirma a organização.
A instituição usa como base para a requisição uma análise de diretrizes, metas e objetivos para que o governo federal promova políticas de igualdade racial. O trabalho foi redigido pelo grupo de estudos sócio fiscais da Universidade Federal de Goiás, composto pelo Prof. Dr. Francisco M. M. Tavares, Carolina L. Gonçalves, Guilherme Nascimento e Pedro Henrique Melo Albernaz.
"Não basta desenhar políticas de igualdade racial, é preciso operacionalizá-las no orçamento de modo coordenado – com diretrizes, metas e objetivos – , bem como mecanismos de monitoramento que fiscalizem tanto a aplicação dos recursos destinados como a efetividade dos respectivos programas", argumenta.
Dentre outros argumentos e embasamentos científicos e com base na nota técnica da UFG, a Educafro pede na ação civil pública:A criação de um Fundo Especial e Permanente de Combate ao Racismo e Emancipação da População Negra, de âmbito nacional cujos recursos captados devem ser aplicados exclusivamente nas ações, programas, projetos e atividades voltados à política de Promoção da Igualdade Racial. O montante seria originado da arrecadação tributária da União, sem aumento da carga tributária.
Que seja intimado o representante do Ministério Público para apresentar parecer, nos termos da lei. Além da cobrança de resposta da União.
A condenação da União Federal para que reconheça formalmente os danos causados à população negra, em
virtude do racismo, pedido de desculpas e, em ato contínuo, crie um fundo de combate ao racismo e emancipação da população negra, cujos recursos não sejam contingenciados, em prazo a ser definido pela Corte que responderá a demanda.
Para o advogado do grupo e procurador de Justiça, Irapuã Santanna, a ação é uma "construção coletiva", "em que todos os nossos ancestrais acabaram por contribuir de alguma maneira".
"Tivemos o cuidado de preparar todo um fortalecimento da narrativa e de contar a história para apontar que o Brasil enquanto país e enquanto nação vem, desde a época da escravidão, até os dias atuais, prejudicando ostensivamente a população negra. Seja por ação, dentro da formulação de políticas públicas, ou por omissão, pela não formulação de políticas públicas que viessem diminuir os danos. Apontamos esses atos lesivos, ainda que tenha a capa de legalidade ou legitimidade jurídica, mas que acabam prejudicando a população negra", disse o procurador.
Para o ex-presidente da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra, da Ordem dos Advogados do Brasil(CNVEN/OAB) e atual presidente da referida comissão, no Estado do Rio de Janeiro, Humberto Adami a ação é uma das "muitas tentativas que força a um posicionamento do estado brasileiro através de uma ação judicial".
"O caminho da reparação da escravidão é a pauta mais importante do cenário brasileiro. Ela não está em nenhuma campanha eleitoral de partidos de A a Z e ela é a pauta que leva o Brasil de hoje, sem projeto, ela vai discutir o retorno do 14 de maio no pós-abolição. O Brasil está parado em 1988 e precisa avançar para onde os cidadãos brasileiros pretos e pardos tenham o mesmo direito que os demais grupos étnicos do Brasil. A reparação da escravidão é a chave do futuro do Brasil", argumenta o advogado.
Segundo o coordenador da Educafro, Frei David, o dia foi escolhido pela entidade "com o objetivo de refundar o 13 de maio, numa perspectiva de lutas por reparação". "Basta desta visão superficial de que a princesa foi a redentora do povo afro", disse.
Para a organização, a desigualdade racial presente no país "viola frontalmente" o que a Constituição Federal assegura. A entidade também avalia que o Estatuto da Igualdade Racial é ignorado pelos governos de todas as esferas, do municipal ao federal.
"Tanto por ação, quanto por omissão, o estado brasileiro, representado pela União Federal, incide na prática de ato ilícito ao promover a marginalização da população negra. Dessa forma, tem-se que tanto por ação, quanto por omissão, o Estado, representado pela União federal, incide na prática de ato ilícito ao promover a marginalização da população negra", explica a Educafro em um trecho do documento.
A ação civil pública foi ajuizada na 5ª Vara Cível Federal de São Paulo. Após recursos, o processo deve ir a julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). O Ministério Público Federal (MPF) e a Advocacia-Geral da União (AGU) devem dar seus pareceres sobre o tema.
A organização diz ter tomado a decisão de ir à Justiça contra a União após um caso ocorrido na cidade de Evanston, no estado de Illinois (EUA). Em março do ano passado, a Câmara Municipal da cidade determinou o pagamento de restituições em dinheiro a pessoas negras, como forma de reparação histórica pela escravidão, políticas de segregação e consequências do racismo ao longo dos anos.
Em Evanston, o programa de reparação vai funcionar com a distribuição de até US$ 5 mil (R$ 138 mil) para as famílias negras. Para financiá-lo, a cidade usará doações comunitárias e a receita do imposto sob a maconha recreativa, que foi legalizada em 2020. A ideia é distribuir cerca de US$ 10 milhões por 10 anos.
O brutal assassinato de George Floyd, que gerou manifestações no mundo inteiro, fez outros países tomarem medidas semelhantes. Suíça e Canadá, por exemplo, também já discutem a possibilidade de reparações aos negros.
Em 2019, os suíços criaram o Comitê de Reparação da Escravatura (SCORES). O grupo avaliou que o país lucrou com o processo escravocrata ocorrido entre as Américas e a África e, por isso, exigiu "reconhecimento e reparação imaterial e material".
Neste ano, o diretor de uma das faculdades mais prestigiadas do mundo, a Universidade Harvard, em Cambridge, também informou que o centro de ensino criaria um fundo para financiar projetos de pesquisa sobre a escravidão.
Em relatórios recentes, Harvard foi acusada de corroborar com pesquisas de teses racistas. "A escravidão e sua herança fazem parte da história americana há mais de 400 anos. O trabalho de reparação de seus efeitos persistentes necessitará de esforços ambiciosos nos próximos anos", declarou o presidente da universidade norte-americana, Larry Bacow.
O início da onda de protestos foi em Minnesota, mas as manifestações se estenderam a diferentes cidades dos Estados Unidos e do mundoRobert Nickelsberg/Getty Images
No documento, "além de uma postura abusiva no passado", a Educafro alega que o governo atual vulnerabiliza os cidadãos negros de modo sistemático, além de não elaborar políticas que efetivamente atuem contra os prejuízos da escravidão e, consequentemente, do racismo estrutural.
"Observando-se os dados sociais do país, verifica-se que o estado não somente segue inerte para cumprir um dos objetivos da República, como também atua de maneira a se manter o panorama inalterado", afirma a organização.
A instituição usa como base para a requisição uma análise de diretrizes, metas e objetivos para que o governo federal promova políticas de igualdade racial. O trabalho foi redigido pelo grupo de estudos sócio fiscais da Universidade Federal de Goiás, composto pelo Prof. Dr. Francisco M. M. Tavares, Carolina L. Gonçalves, Guilherme Nascimento e Pedro Henrique Melo Albernaz.
"Não basta desenhar políticas de igualdade racial, é preciso operacionalizá-las no orçamento de modo coordenado – com diretrizes, metas e objetivos – , bem como mecanismos de monitoramento que fiscalizem tanto a aplicação dos recursos destinados como a efetividade dos respectivos programas", argumenta.
Dentre outros argumentos e embasamentos científicos e com base na nota técnica da UFG, a Educafro pede na ação civil pública:A criação de um Fundo Especial e Permanente de Combate ao Racismo e Emancipação da População Negra, de âmbito nacional cujos recursos captados devem ser aplicados exclusivamente nas ações, programas, projetos e atividades voltados à política de Promoção da Igualdade Racial. O montante seria originado da arrecadação tributária da União, sem aumento da carga tributária.
Que seja intimado o representante do Ministério Público para apresentar parecer, nos termos da lei. Além da cobrança de resposta da União.
A condenação da União Federal para que reconheça formalmente os danos causados à população negra, em
virtude do racismo, pedido de desculpas e, em ato contínuo, crie um fundo de combate ao racismo e emancipação da população negra, cujos recursos não sejam contingenciados, em prazo a ser definido pela Corte que responderá a demanda.
Para o advogado do grupo e procurador de Justiça, Irapuã Santanna, a ação é uma "construção coletiva", "em que todos os nossos ancestrais acabaram por contribuir de alguma maneira".
"Tivemos o cuidado de preparar todo um fortalecimento da narrativa e de contar a história para apontar que o Brasil enquanto país e enquanto nação vem, desde a época da escravidão, até os dias atuais, prejudicando ostensivamente a população negra. Seja por ação, dentro da formulação de políticas públicas, ou por omissão, pela não formulação de políticas públicas que viessem diminuir os danos. Apontamos esses atos lesivos, ainda que tenha a capa de legalidade ou legitimidade jurídica, mas que acabam prejudicando a população negra", disse o procurador.
Para o ex-presidente da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra, da Ordem dos Advogados do Brasil(CNVEN/OAB) e atual presidente da referida comissão, no Estado do Rio de Janeiro, Humberto Adami a ação é uma das "muitas tentativas que força a um posicionamento do estado brasileiro através de uma ação judicial".
"O caminho da reparação da escravidão é a pauta mais importante do cenário brasileiro. Ela não está em nenhuma campanha eleitoral de partidos de A a Z e ela é a pauta que leva o Brasil de hoje, sem projeto, ela vai discutir o retorno do 14 de maio no pós-abolição. O Brasil está parado em 1988 e precisa avançar para onde os cidadãos brasileiros pretos e pardos tenham o mesmo direito que os demais grupos étnicos do Brasil. A reparação da escravidão é a chave do futuro do Brasil", argumenta o advogado.
Não coloquei toda a matéria do Metrópoles, pois enaltece a atuação da "ONG".
Minha opinião, e que fique claro que trata-se de uma opinião pessoal, é que busca-se uma reparação contra o ente jurídico errado. Digo isso, pois historicamente, em se tratando de Brasil, os escravos que para cá vieram, foram vendidos aos portugueses. Isso não ameniza o horror da atividade mercantil, mas, se for para atribuir a correta responsabilidade, seria sobre Portugal e os Africanos que, atacando seus pares, os que não perdiam a vida, perdiam a liberdade, sendo vendidos como mercadoria.
Confundir um sentimento de racismo, que é deplorável, mas ficou enraizado na cultura do brasileiro, devendo ser combatido, é atribuir responsabilidade sobre uma sociedade que viveu um período de falta de informação e conceitos errados. Atribuo isso como oportunismo em buscar holofotes, já considerando que todas instâncias jurídicas inferiores irão aceitar tal processo.
Além do que, usar um caso isolado de uma cidade que vai usar como receita, recursos da venda de "Maconha Recreativa" e doações, projetando um limite em 10 anos, que não é uma receita corrente, isso se passar, cairia sobre o bolso da população, que não pode ser condenada pelo erro de outros. Essa cultura de indenizações passadas, jogando no colo de forma direta (impostos e tributos, além dos cortes de orçamento para fazer frente a pagamentos extraordinários) afetando diretamente os serviços que o poder público deveria prestar ao cidadão, que no final, é quem paga a conta.
Finalizo que lamento o que houve no passado, com esse horror que é manter outro ser humano como propriedade, contra sua vontade e desejo, mas que culpados e responsáveis, se de fato puder ser atribuído, são outros e não a sociedade brasileira.
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