O medo de altura não impediu Katia Cunha, sócia-diretora da consultoria tributária Kronos Soluções, de voar em asa-delta. O salto dela, realizado no Rio de Janeiro há pouco mais de um ano, foi o primeiro dos cerca de 30 que aconteceriam logo na sequência - todos de funcionários da Kronos.
Na tentativa de motivar a equipe, levar união para o grupo, diminuir o estresse, aprender a lidar com a insegurança e o medo na rotina de trabalho, Katia procurou um treinamento corporativo que fugisse do comum. "Temos um trabalho muito estressante, queria proporcionar algo que alcançasse as pessoas", afirma.
O treinamento é oferecido pela Superar, consultoria criada em 2008 pelo instrutor de asa-delta e parapente Ruy Marra, que já voou com mais de 24 mil pessoas. Graduado em direito, com uma pós em biopsicologia e formação em coaching, Marra desenvolveu um treinamento com base na neurociência cujo objetivo é melhorar o desempenho técnico e emocional.
De início, os profissionais aprendem a fazer um tipo específico de respiração que ajuda a encarar melhor situações estressantes. São submetidos, então, a um jogo, que os coloca sob pressão e os avalia fisicamente, com monitoramento da frequência cardíaca. A parte prática pode ser um voo de asa-delta ou, para os que preferem um ambiente mais controlado, tirolesa ou arborismo.
Depois que o aprendizado cardiorrespiratório é colocado em prática em uma situação real de tensão, a frequência cardíaca dos participantes é novamente monitorada. "Conseguimos mapear as emoções dos profissionais e fazer um retrato de antes e depois do treinamento", afirma Marra. "Essa capacitação dá às pessoas uma estrutura emocional para que elas possam atingir seus objetivos."
Katia conta que a situação de estresse causada pelo voo de asa-delta refletiu positivamente na equipe da Kronos, até para os mais céticos. "Tínhamos um programador de extrema eficiência, mas que reagia muito mal quando havia prazos curtos para as entregas. Ele mudou sua postura após o treinamento", conta.
Luca Borroni, diretor dos programas de educação executiva do Insper, acredita que treinamentos experienciais podem, sim, levar algum aprendizado para a vida profissional, desde que sejam bem estruturados. Segundo ele, quando se oferece ao funcionário uma atividade que o faz pensar "fora da caixa", é preciso ter bem claro quais são os objetivos de aprendizagem, as competências organizacionais que essas atividades querem promover e como a experiência em si resulta em capacitação. "Caso esse objetivo não estiver claro para os participantes, a experiência não terá utilidade."
Em agosto deste ano, a multinacional da área química Dow também colocou alguns de seus funcionários em uma situação nada rotineira. De vários escritórios da companhia no mundo, 41 profissionais - sendo quatro do Brasil - viajaram para a Etiópia, na África, em um programa chamado "Liderança em Ação". Após cinco meses de trabalho remoto conjunto, os executivos tiveram que desenvolver soluções para organizações sem fins lucrativos em áreas como saneamento básico, educação, negócios e agricultura. Tudo para aprimorar as habilidades de liderança.
Susannah Thomas, diretora de Recursos Humanos da Dow para a América Latina, diz que entre as competências que os participantes podem aprimorar com a experiência estão liderança em um grupo multicultural, e em ambiente em que eles nunca estiveram antes. "Ninguém ali era especialista em habitação ou agricultura, mas trabalhar em áreas que não são familiares, e somente com os recursos disponíveis, pode ajudar a desenvolver habilidades", afirma. A primeira edição do projeto, no ano passado, foi em Gana, também na África.
Na Telefônica Vivo, o desafio foi identificar, primeiro, qual tipo de treinamento seria capaz de engajar a equipe de vendas da empresa, composta majoritariamente por jovens. "Tínhamos que trabalhar com uma metodologia que atraísse a atenção dos vendedores e facilitasse a absorção do conhecimento", diz Marcio Pereira Domingues, gerente de capacitação comercial da operadora.
A saída foi promover um treinamento baseado em jogos presenciais e on-line. As atividades foram colocadas em prática entre outubro e novembro de 2013. O objetivo do programa era fazer com que os participantes conhecessem melhor os clientes, fossem mais criativos e inovadores ao oferecer soluções ao consumidor e fizessem entregas com mais qualidade. "A ideia era preparar e qualificar a equipe em técnicas de vendas mais consultivas", explica Domingues.
Com a metodologia "gameficada", a Telefônica Vivo conseguiu a adesão voluntária de mais de 7 mil vendedores ao programa. "O game atraiu muito mais que um treinamento tradicional." Diante do sucesso, uma nova rodada do treinamento está prevista para o fim deste ano.
Daniel Orlean, sócio-diretor da Affero Lab, empresa de educação corporativa responsável pelo desenvolvimento do programa "Jogos da Vivo 2013", afirma que a antiga fórmula dos treinamentos, com um professor falando em uma sala de aula, nem sempre engaja a audiência. "Por isso a necessidade de uma busca constante por um aprendizado divertido e inovador", diz.
Os games normalmente funcionam muito bem com os jovens, mas podem atingir todos os públicos e níveis hierárquicos, caso sejam planejados para isso. Segundo Orlean, a Affero Lab já organizou, com sucesso, treinamentos com jogos até para executivos do topo da hierarquia de multinacionais.
No escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, a proposta é um pouco diferente. A preferência é por mesclar treinamentos mais tradicionais, ministrados por escolas de renome em áreas como economia, finanças e jurídico, com palestras relacionadas a humanidades. "Dentro do nosso programa de capacitação, achamos importante fortalecer a cultura geral e visão de mundo dos funcionários", afirma o sócio Adriano Schnur.
As palestras, abertas a todos os colaboradores, acontecem cinco vezes por ano. São ministradas pela Casa do Saber e reúnem, em média, 80 pessoas por evento. Entre os temas já abordados estão "as grandes viradas da história", "como se deve viver: vale tudo para ser feliz", "psicologia das mentiras e das verdades" e "casamento feliz". Também entram na lista temas relacionados a atualidades, como "ascensão e queda dos rótulos políticos", "administração do tempo", "introdução às redes sociais" e "empreendedorismo".
A parceria do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados com a Casa do Saber vai completar sete anos. E, ao que tudo indica, cresce o número de empresas interessadas em oferecer aos seus funcionários palestras sobre filosofia, atualidades e debates públicos. Segundo Mario Vitor Santos, diretor-executivo da Casa do Saber, o atendimento corporativo cresceu 100% até setembro deste ano na comparação com o mesmo período de 2013. "Por conta da rotina de trabalho, há uma aridez que impacta no ambiente corporativo. As empresas acabam buscando as palestras para estimular a criatividade, aumentar a motivação e a felicidade do funcionário".
Para que as palestras tenham esse efeito, Santos diz que é importante montar um ambiente agradável e relaxante. Oferecer vinho aos participantes, por exemplo, é tradicional nos cursos da Casa do Saber. "A intenção é construir um momento em que se possa repensar novas questões de maneira informal, inclusive com quebra de hierarquia [corporativa e na relação aluno e professor]", enfatiza.
Para Luca Borroni, do Insper, as atividades experienciais causam impacto porque fogem da rotina de trabalho, o que leva os executivos a saírem da zona de conforto e a pensar de forma mais crítica. Ele alerta, porém, que esses momentos mais lúdicos são apenas um complemento. "Para alcançar os resultados, é preciso que eles estejam inseridos em um programa maior de desenvolvimento de competências."
Fonte: Valor Econômico
De início, os profissionais aprendem a fazer um tipo específico de respiração que ajuda a encarar melhor situações estressantes. São submetidos, então, a um jogo, que os coloca sob pressão e os avalia fisicamente, com monitoramento da frequência cardíaca. A parte prática pode ser um voo de asa-delta ou, para os que preferem um ambiente mais controlado, tirolesa ou arborismo.
Depois que o aprendizado cardiorrespiratório é colocado em prática em uma situação real de tensão, a frequência cardíaca dos participantes é novamente monitorada. "Conseguimos mapear as emoções dos profissionais e fazer um retrato de antes e depois do treinamento", afirma Marra. "Essa capacitação dá às pessoas uma estrutura emocional para que elas possam atingir seus objetivos."
Katia conta que a situação de estresse causada pelo voo de asa-delta refletiu positivamente na equipe da Kronos, até para os mais céticos. "Tínhamos um programador de extrema eficiência, mas que reagia muito mal quando havia prazos curtos para as entregas. Ele mudou sua postura após o treinamento", conta.
Luca Borroni, diretor dos programas de educação executiva do Insper, acredita que treinamentos experienciais podem, sim, levar algum aprendizado para a vida profissional, desde que sejam bem estruturados. Segundo ele, quando se oferece ao funcionário uma atividade que o faz pensar "fora da caixa", é preciso ter bem claro quais são os objetivos de aprendizagem, as competências organizacionais que essas atividades querem promover e como a experiência em si resulta em capacitação. "Caso esse objetivo não estiver claro para os participantes, a experiência não terá utilidade."
Em agosto deste ano, a multinacional da área química Dow também colocou alguns de seus funcionários em uma situação nada rotineira. De vários escritórios da companhia no mundo, 41 profissionais - sendo quatro do Brasil - viajaram para a Etiópia, na África, em um programa chamado "Liderança em Ação". Após cinco meses de trabalho remoto conjunto, os executivos tiveram que desenvolver soluções para organizações sem fins lucrativos em áreas como saneamento básico, educação, negócios e agricultura. Tudo para aprimorar as habilidades de liderança.
Susannah Thomas, diretora de Recursos Humanos da Dow para a América Latina, diz que entre as competências que os participantes podem aprimorar com a experiência estão liderança em um grupo multicultural, e em ambiente em que eles nunca estiveram antes. "Ninguém ali era especialista em habitação ou agricultura, mas trabalhar em áreas que não são familiares, e somente com os recursos disponíveis, pode ajudar a desenvolver habilidades", afirma. A primeira edição do projeto, no ano passado, foi em Gana, também na África.
Na Telefônica Vivo, o desafio foi identificar, primeiro, qual tipo de treinamento seria capaz de engajar a equipe de vendas da empresa, composta majoritariamente por jovens. "Tínhamos que trabalhar com uma metodologia que atraísse a atenção dos vendedores e facilitasse a absorção do conhecimento", diz Marcio Pereira Domingues, gerente de capacitação comercial da operadora.
A saída foi promover um treinamento baseado em jogos presenciais e on-line. As atividades foram colocadas em prática entre outubro e novembro de 2013. O objetivo do programa era fazer com que os participantes conhecessem melhor os clientes, fossem mais criativos e inovadores ao oferecer soluções ao consumidor e fizessem entregas com mais qualidade. "A ideia era preparar e qualificar a equipe em técnicas de vendas mais consultivas", explica Domingues.
Com a metodologia "gameficada", a Telefônica Vivo conseguiu a adesão voluntária de mais de 7 mil vendedores ao programa. "O game atraiu muito mais que um treinamento tradicional." Diante do sucesso, uma nova rodada do treinamento está prevista para o fim deste ano.
Daniel Orlean, sócio-diretor da Affero Lab, empresa de educação corporativa responsável pelo desenvolvimento do programa "Jogos da Vivo 2013", afirma que a antiga fórmula dos treinamentos, com um professor falando em uma sala de aula, nem sempre engaja a audiência. "Por isso a necessidade de uma busca constante por um aprendizado divertido e inovador", diz.
Os games normalmente funcionam muito bem com os jovens, mas podem atingir todos os públicos e níveis hierárquicos, caso sejam planejados para isso. Segundo Orlean, a Affero Lab já organizou, com sucesso, treinamentos com jogos até para executivos do topo da hierarquia de multinacionais.
No escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, a proposta é um pouco diferente. A preferência é por mesclar treinamentos mais tradicionais, ministrados por escolas de renome em áreas como economia, finanças e jurídico, com palestras relacionadas a humanidades. "Dentro do nosso programa de capacitação, achamos importante fortalecer a cultura geral e visão de mundo dos funcionários", afirma o sócio Adriano Schnur.
As palestras, abertas a todos os colaboradores, acontecem cinco vezes por ano. São ministradas pela Casa do Saber e reúnem, em média, 80 pessoas por evento. Entre os temas já abordados estão "as grandes viradas da história", "como se deve viver: vale tudo para ser feliz", "psicologia das mentiras e das verdades" e "casamento feliz". Também entram na lista temas relacionados a atualidades, como "ascensão e queda dos rótulos políticos", "administração do tempo", "introdução às redes sociais" e "empreendedorismo".
A parceria do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados com a Casa do Saber vai completar sete anos. E, ao que tudo indica, cresce o número de empresas interessadas em oferecer aos seus funcionários palestras sobre filosofia, atualidades e debates públicos. Segundo Mario Vitor Santos, diretor-executivo da Casa do Saber, o atendimento corporativo cresceu 100% até setembro deste ano na comparação com o mesmo período de 2013. "Por conta da rotina de trabalho, há uma aridez que impacta no ambiente corporativo. As empresas acabam buscando as palestras para estimular a criatividade, aumentar a motivação e a felicidade do funcionário".
Para que as palestras tenham esse efeito, Santos diz que é importante montar um ambiente agradável e relaxante. Oferecer vinho aos participantes, por exemplo, é tradicional nos cursos da Casa do Saber. "A intenção é construir um momento em que se possa repensar novas questões de maneira informal, inclusive com quebra de hierarquia [corporativa e na relação aluno e professor]", enfatiza.
Para Luca Borroni, do Insper, as atividades experienciais causam impacto porque fogem da rotina de trabalho, o que leva os executivos a saírem da zona de conforto e a pensar de forma mais crítica. Ele alerta, porém, que esses momentos mais lúdicos são apenas um complemento. "Para alcançar os resultados, é preciso que eles estejam inseridos em um programa maior de desenvolvimento de competências."
Fonte: Valor Econômico
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